Para que as emoções não se percam
Por que escrevo? Para encontrar a resposta reportei-me aos meus sete anos e alguns meses. Vestidinho branco, comprido até as canelas, laço de fita nos cabelos castanhos, olhos esverdeados brilhando, excitados. Revejo o quarto simples, as três camas de madeira lustrosa e sinto um leve perfume de jasmim. Em cima da cama, encostada na parede esquerda do quarto, um embrulho de papel colorido. Revivo a emoção da menininha, desembrulhando, coração aos pulos, respiração suspensa, o pacote colorido. O gato de botas! E foi assim que meu pai me ensinou a amar livros e o verdadeiro encanto de uma boa surpresa. Chegava de mansinho, entrava no quarto em que eu dormia com minhas irmãs e deixava em minha cama um livro de contos de fadas. Não sei como conseguia, mas nunca o peguei no ato. Trazia um livro por semana, em dias alternados, para que a surpresa continuasse. Dias depois da entrega, pedia para que eu lesse para ele. Com paciência e carinho, ensinou-me a compreender as emoções transmitidas pelas palavras lidas. E também a importância de visualizar as ilustrações cuidadosamente, analisando cada traço, cada nuance das cores utilizadas. Mostrou-me a influência do desenho na compreensão das características dos personagens. Como adulto sensível que era, sabia que crianças lêem primeiro com os olhos da alma. Depois, em minhas primeiras dissertações escolares, utilizei os ensinamentos de meu pai, mais do que os das professoras, que não conseguiam atingir minha sensibilidade. E segui em frente, através das idades, assimilando felicidade, dor, mágoa, amor, carências, maternidades e transformando tudo em escrita, como uma fórmula mágica para não deixar as emoções se perderem ou a vida simplesmente passar. Foto: Arquivo pessoal Ly Sabas
Enviado por Ly Sabas em 21/10/2005
Alterado em 13/07/2009 Copyright © 2005. Todos os direitos reservados. Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor. |